"Lendo Plutarco"
Vangloriava-se de estar
a salvo de um mal:
perder
um filho.
Tornara-se imune a essa dor
de modo simples:
não tendo
filhos.
Sábio homem, esse,
cujo medo de perder
um filho
o fez perder
todos os filhos.
Sábio homem, esse
grego,
esse grande,
esse pobre
Tales de Mileto.
(Ruy Espinheira Filho, poeta brasileiro)
Este poema é baseado na história de Sólon, contada por Plutarco aqui (ao fundo da página) e aqui. Parece que Tales tinha um amigo chamado Sólon que lhe perguntou por que razão não tinha tido filhos. Em jeito de resposta, Tales arquitectou a seguinte manha: enviou um mensageiro a casa de Sólon a dizer que o filho daquele tinha morrido, ao que o pobre Sólon desatou a gritar e a arrancar cabelos. O Tales chega lá, todo ufano, e diz-lhe, à maneira de budista zen: "Não te preocupes, o teu filho não morreu. Mas visto o estado em que uma tal notícia deixa um homem tão razoável como tu, já vês por que razão não quero ter filhos" (ou words to that effect).
A falácia é desmontada por Plutarco, que comenta que é "irracional e pobre de espírito não ousar adquirir o que desejamos por medo de o perder, já que pela mesma lógica não deveríamos cobiçar riqueza, glória ou sabedoria, por temermos perdê-los; mesmo a saúde, a mais desejável das posses, se perde por doença" (tradução livre). Que é como quem diz que há outra forma de dor, mais vazia e árida que a de perder o que amamos, e que envena muitas vidas & velhices: a de nunca ter tentado. Poets say it better: "Talvez por não ousar / Ninguém mereça o que viveu / Talvez não amanheça" (versinhos de Vasco Graça Moura, in "Soneto Destruído", que me perseguem como um aviso).
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